quinta-feira, 16 de agosto de 2012

Deu para rir. Vira e mexe mostra os dentes à toa, não emite um som sequer e aperta os olhos enxergando à frente sabe-se lá o quê, visto que talvez haja meio milímetro entre as palpebras, nem isso. Ri. Quando a dona lhe fechou na cara , por engano, a porta de peroba de lei, ele riu coçando do estomago aos mamilos, debuxando paralelos imaginários na camiseta preta, deixando escapar em profundos suspiros o que antes coagularia no fígado uma cicatriz de ódio, gatilho para a autodestruição, agora um foda-se. Um ska, um samba, um mantra, Joni Mitchell. Rindo, não aceita que lhe chamem bipolar, que isso é coisa de viado. Rindo, expurga os demônios, atrai felicidade, tira as notas do bolso e paga para uma puta, daquelas mais caras, limpas e de bundas inacreditávelmente gostosas, que é para não ter mais envolvimento na hora do sexo. Agora ri depois canta, vai para o Jazz de luz baixa recendente à maconha, tunante, junta-se à marginália de agora e caminha em paz. Foda-se, riscando paralelos na camiseta preta ri o homem de tímida decência encerrando um longo ciclo de ódio e passado. Ri ignorando todos nós, o resto. 
Ri acreditando numa próxima vez que amará o mundo.

segunda-feira, 13 de agosto de 2012

Psicopata era o que era assim por dizer.  Passeava só à esgueira, trajava decencia tímida e nunca parecia chegar, como visagem materializava-se intenso em qualquer espaço onde pudesse positivar sua energia. De sobriedade garbosa, jamais retocara o mau ar herdado do pai, carregado durante a primeira metade da vida sem alguma desfaçatez que valha a máscara. Garantiu-se sempre com meio sorriso no canto da boca, dócil, estimado antes do pico da espora. Já andava pelos primeiros pelos brancos na face quando reconheceu em si a agência da negrura. As mãos à garganta, a causa dos males do fígado, a fumaça do tabaco sufocando o peito, 1.000.000 de dbSPL, agonia. A placenta, o parto. Uma síndrome de Fausto, Mefisto ao lado. O que para o menino Demian demorou uma infância para aquele homem levara uma vida. Ciente de seu estado de aversão e rancor que mal podia disfarçar, cada vez mais latente, decidiu-se. Às raposas, deitou.
Correu como o vento pela Comandante Elias Zarzur e, à moda da flecha, cravou-se no meio do asfalto da Rua Isabel Schimidt, sendo então atropelado por um micro-ônibus cuja motorista sentiu apenas a direção aos solavancos enquanto guiava sobre os sofrimentos do jovem doente que deixava sua vida pelo asfalto, aos 25 anos, após uma aula sobre o épico Gilgamesh na faculdade de história.

segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Em qualquer tarde de sol foi que apareci. O céu escandalosamente azul serviu como rotunda divinal onde em frente fiz a reestréia. Vinha de Bukowsky no bolso, pretexto para saber como estava a vida. Saber da vida, escusa para vivê-la. Toquei a campainha com certa luta. O comutador comemorava o chamado bailando dentro da parede, escorregava sob meus dedos parecendo rir, como que prevendo a dona deslizando pelos lençóis colocados às pressas no calor da madrugada, sinalizava à saudade, falta um parafuso, que falta faz um homem em casa.

Sorria o céu na mais fria tarde de sol do ano. Falta um parafuso aqui, outro acolá. Falanges à delirar pelo corpo como não ousara imaginar antes do ding dong. Ouvi o chamado, olhei para o alto, um anjo falava meu nome. Antes que voltasse ao seu céu me levou a voar em Suas Asas. Que tipo de sacrílego eu seria se odiasse um anjo? Depois da maré baixa, sempre vem a maré cheia. Eu soube a dor da ingratidão por outros caminhos, mas a maré levou, Martinho da Vila, as mágoas do meu coração. Enquanto descia pela escada de degraus graves sem corrimão seu corpo não hesitou. O abraço dela ainda está aqui, como se toda vez que lembrasse de sua perfeição o calor imisturável daquele corpo de pele branca e vivos olhos emanasse pelo ar fazendo minha carne vibrar em ondas consonantes, vem assim como lembrança e ainda aquece o peito, por dentro.

Como sua roupa foi minha prudência, mínima. Me atirei de trampolim à inocência do sentimento. Fêmea, há inocência no sentimento. A volta pelo passeio, de quando fomos comprar cerveja, as incontáveis reclamações sobre o ex namorado. Fui até o fim um amador, meio apaixonado que estava, Chico não é Renato e sou fã de ambos. Já fui marginal suficiente para não capitular, fui infeliz em conter invasão, passivo às quimeras outra feita. O sonho é a merda esfregada na cara do homem.

O sol da sexta, 13, pontuou. Iluminou uma vereda cujo caminhante retirava-se à socapa, cautelosamente, temeroso de tantos ossos quebrados e tanto dor mal curada. E quando eu pensei que ia, enchi o peito e contra a luz sorri, eis o breu. A luz corre rápida tanto quanto sua ausência pode ser sentida, tanto quanto um clichê pode ser usado, tanto quanto um bobo pode ser lubibriado. A criança com o doce na boca, há quem tome, há quem fotografe. A maldade não faz sombra, é toda luz e onde pode iluminar, é cênica. Para além dos devaneios desta febre de garganta que me assola, há muita dor e calor pelos caminho que abandonaste.