quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Eu escuto ela gritar. Não me agrada gritaria. Eu não gosto do sotaque dela. Eu nunca mais vou ser atropelado só para não ter que conviver com as vizinhas-donas-de-casa-entediadas. Elas gritam, urram seus preconceitos para que eu ouça. Fazem com que suas vozes demasiada irritantes cheguem ao meu ouvido: bandidos maconheiros. Desperta em mim aquele velho ódio. Mas o bandido maconheiro aqui não tem maconha para fumar. Nem mais paciência e serenidade para ouvir calado toda a sabedoria de uma dona-de-casa semianalfabeta que veio do Cariri no último pau-de-arara. Eu adoro o nordeste, tenho sangue baiano. E meu sangue baiano-paranaense-paulista quer mandar ela tomar bem no meio do cú e dizer: cala a porra da boca paraíba retirante de merda. Não é preconceito, é só ódio. Uma ode à burrice.

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

E, como não vou escrever na carta, nem vou escrever mais uma carta, se quer saber terá que aqui vir a ler, lhe digo que o meu sol ainda não encontrei. Achei que se escondia atrás da serra, mas sua insensatez mostrou-me o contrário. Eu estou prestes a ir embora e se é o que também quer, vá. Não encontramos nossa luz: não encontraremos iluminação alguma enquanto nos olharmos no escuro.
Eu escrevo para mim. Vez por outra alguém cai aqui, logo se vai. Caio por aí e demoro para me encontrar. Estou emburrado, estou nervoso, estou irritado e já cansado venho há muito tempo de estar assim. Um sorriso me acalmaria, o seu sorriso, nega-me com certeza. A vontade é de gritar, ódio que vem de novo e bate a porta da boca; abro e rumino por tempo, qualquer medição dele é vã, ódio é eterno e como dura! Dura até o tempo de sair por aí na chuva querendo esquecer a raiva, mas nem mais posso andar pelas ruas escuras da madrugada bernardense: minhas duas pernas estão quebradas, meu coração está partido e o choro de ódio quer sair pela boca expurgando reminiscências e expulsando essa desgraça que me empurra para baixo. Mas nada posso fazer. 

domingo, 26 de setembro de 2010

Em algum lugar hei de encontrar beleza efêmera. Como as borboletas e joaninhas que cercaram minha infância, como a paz que fito no olhar dos tranquilos e, de certa forma não destrutiva, invejo esses que aceitam passivos toda a desgraça que acompanha a vida lá fora. Ontem ele me disse que devo ter serenidade para aceitar aquilo que não posso mudar. Hoje procuro o caminho das flores donde me perdi em caminhadas vãs pela grande urbe, e está tão longe agora que já não sei se alcanço o sorriso dela novamente; me perdi. 'E vivi perdido, vivendo em erro, sem querer me machucar de novo por culpa do amor.' Toda beleza é efêmera e felicidade é não viver procurando.

domingo, 19 de setembro de 2010

Perdão senhor, se estou aqui é porque pequei.
Pequei contra a inocência. Por minha falta inconsciente eu fui punido com a mão pesada da justiça divina cuja ira não pude suportar e sucumbi multifraturado sob dezenas de seus servos. Ante os olhos da multidão meu corpo desarticulado permaneceu, assim como um tapa rubra e formiga a face, sua mão sobre mim deixou o registro de toda dor que por anos eu recusei sem negociação. Qual era sua intenção? Tornar-me inútil para minha vida ou minha vida inútil para o seu mundo? Ainda ouso perguntar, sabido estou da resposta. Eu nasci a 19 de Abril. Eu sou a véspera.
A roda viva me hostilizava, semimorto, suicida. Às dezenas, como previsto por Trevisan, fumavam, riam e discordavam se era eu um suicida ou desatento. Fui difamado, caluniado, humilhado, multifraturado. Pelo que estava pagando? O preço é alto. Saiba Deus, não me tirou um ano de vida, me deu todos os outros para viver sem toda aquela merda que eu vinha carregado desde que levou meu Pai daqui. Toda aquela gente estúpida e sem graça que vinha junto com a merda carregada com honra em meus braços. Toda aquela gente inerte que acha. Toda a sorte de imbecis.
Se estou assim é porque pequei. Contra a minha inocência, contra a graça e o amor de viver em paz. O preço é a sua ira. 5 meses atrás, exatamente, 10 toneladas de aço e gente e vivo para contar que eu não sei quem era em meu corpo por todos esses anos.
Adeus, mundo cruel.

Que haja vida.