sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

Inspiro ares pradiais nesta tarde de tintas verdes às paredes do meu dormitório. Parte da cerâmica foi retirada dando lugar a alguns metros quadrados de massa queimada, colorida a verde musgo muito escuro. Traços paralelos de poucos metros, meio-lote de tons vegetais e branco, persiana azul-royal, comutadores limpos liberam eletricidade e aviva lâmpada de sódio presa no bocal, verde. O vento que arrasta fiéis traços do estereótipo que domina este bairro também sacode as fitilhas pretas enganchadas nos fios elétricos expostos à janela do covil pensatório. Venta início de verão, que acinzenta o céu como migalhas de inverno clamantes a gelo para que o natal tenha alguma veracidade. O céu azul, sobre os verdes prados bandeirantes, nega à alva neve, sob o rubro listrado galhardete, o direito de impor à cultura o clima. Resta enfim o sol, quando ele vem.
Pouco ainda me toca. A ilusão do coletivo desta época, outrora acalmadora, inspiradora, reconfortante, é então peremptória: falsa. Que pulse o telefone em outro lar, que vibre o telemóvel em outro bolso, pois já não existem em mim entradas para plásticos sentimentos nem abraços de ocasião, areia na praia em época assim: falsidade trivial, um mar no oceano da minha existência cuja felicidade pinga num conta-gotas meio-que entupido. Vivo ansioso, preciso tirar este mundo de mim antes que cicatrize. Futilidades nunca deixarão de serem futilidades independente o nome que queira dar a elas. Ser fria, grossa, metida e difícil achando ser franca e esperta não muda a aparência que idolatra ostentar. Querer ser o que não é, é a própria expressão da irrelevância. Imagem não é nada se o sentimento importa, redundantemente não há sentimento se a imagem é o que custa. Fala e escreve impropérios a meu respeito enquanto sente minha falta. Ora, não teria sido mais fácil tentar ligar outra vez? Preferiu a difamação. Pelo 15° grau em Touro. Acredito ser esta a causa do recorrente infortúnio, me conduz à idéia o anuário astrológico aberto entre os cannabescos verdes que, apesar da instrução formal teoricamente repelente à superstição, insisto em consultar. Venta que varre os papéis antes organizados sobre a mesa. Ligaste o ventilador, não fechaste a janela?
Perdi alguns dentes nestes anos todos em que defronto a ausência de paisagens deste recinto. Os olhos amolecem ao horizonte avistar, vislumbram a mais distante idéia no panorama da intelectualidade, carecem sempre daquela explosão das paixões necessária à expulsão desta ficção que em mim reside quando o que vejo são cabos elétricos carcomidos por linhas-corrente com cerol, fitilhos pretos engastados, se o que ouço é esse acerbante sotaque paraibano em voz de taquara rachada. A raiva que grafo é a que sinto. Outros tempos era amor. Mas quando expresso a idéia de forma incoerente não é porque estou confuso, e sim é este o estilo literário que tento desenvolver, todavia escrevo com raiva por alívio, não por estilo. Sobre a raiva, escrevo. Se bem me lembro Garcia Marquez, "fale sobre seu terreiro", dizia ele, mesmo abandonado pelo estro, insisto eu.

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